“Há muitos anos fiz um acordo com a minha filha: só dou conselhos se ela me pedir. Partilho muitas vezes esta história nas minhas formações e acompanhamentos, porque acredito que um dos maiores erros que os pais cometem na relação com os filhos é dar conselhos a mais. Tentam ajudar demasiado. E, curiosamente, quando falo com pessoas sobre os seus relacionamentos íntimos, o padrão repete-se: muitas sentem-se pouco ou nada ouvidas.”
Mia

Temos uma tendência para resolver, aconselhar e salvar o outro quando ele partilha um problema. Frases como “O que tens de fazer é…” ou “No teu lugar, eu faria…” são exemplos disso. E, muitas vezes, nem é tanto por acharmos que os outros devem seguir os nossos conselhos, mas porque queremos sentir-nos úteis, importantes, competentes ou até mais ligados àquela pessoa.

No entanto, para quem está a desabafar, esta resposta imediata pode dar a sensação de que não foi realmente ouvido — apenas gerou uma reação automática.

E é aqui que entra uma estratégia simples e eficaz.

Há uma proposta que tem sido partilhada por vários autores e que pode fazer uma enorme diferença nos nossos relacionamentos. A ideia é perguntar à outra pessoa, no momento do desabafo:

“Queres ser ouvido, queres ser ajudado ou queres um abraço?”

Esta pergunta pode evitar muitos mal-entendidos. Porquê? Porque, muitas vezes, o que a pessoa realmente quer quando desabafa, não é ajuda prática nem conselhos — é simplesmente ser ouvida. Ou, por vezes, acolhida com um gesto de carinho.

Quando há um desajuste entre aquilo que a pessoa precisa e o que o outro percepciona ser a sua necessidade e acaba por oferecer, surgem frustrações:

  • Queremos um abraço, mas somos bombardeados com perguntas.
  • Queremos ser ouvidos, mas o outro tenta logo resolver.
  • Precisamos de ajuda, mas a pessoa apenas ouve em silêncio.

Ao fazer esta pergunta simples, damos espaço para que a pessoa que faz o desabafo reconheça o que realmente precisa – pois isso nem sempre é óbvio para ela – e damos a nós próprios clareza sobre como podemos estar verdadeiramente presentes.

A frase “Nunca me ouves!” é familiar para muitos pais, casais e amigos. E a verdade é que muitas vezes estamos, de facto, a ouvir mas usamos o que ouvimos para oferecer soluções, e isso pode não ser o que o outro precisa naquele momento.

Quando alguém desabafa, está a pedir que lhe seja oferecido um espaço seguro. Um espaço onde pode expressar o que sente, sem interrupções, julgamentos ou pressas para “resolver”. Dar conselhos demasiado cedo pode ser como empurrar a pessoa para fora desse espaço.

Passar de um “Fala comigo, que eu vou ajudar-te” para um “Fala comigo, que eu vou ouvir-te” não é fácil, devido ao nosso impulso natural de começar a falar de nós, dar exemplos, explicar como outras pessoas resolveram situações parecidas… mas tudo isso nos desvia do essencial: ouvir de verdade. E isso requer intenção e autoconsciência. 

É importante sermos capazes de reconhecer em nós esta necessidade de sermos ouvidos — sem necessariamente querer conselhos ou soluções. Quando alguém tenta logo resolver o nosso problema, podemos sentir que ainda não tivemos espaço para expressar tudo o que estamos a sentir. E sem esse espaço, não conseguimos processar o que se passa cá dentro.

Nem sempre temos consciência disso. Mas quanto mais nos conhecermos, mais facilmente conseguimos reconhecer este processo em nós — e nos outros. E isso melhora as nossas relações.

Esta estratégia é especialmente valiosa com adolescentes.

Muitos pais sentem frustração, tristeza e distância nesta fase, porque os filhos parecem fechar-se, não valorizar os conselhos dos pais e a relação arrefece. No entanto, muitas vezes, o problema não está na falta de diálogo — está na forma como ouvimos.

Se, em vez de dar lições, moralizar, educar, pararmos e perguntarmos (mesmo que apenas mentalmente):
“Será que o meu filho precisa de ser ouvido, ajudado ou simplesmente abraçado?”,
a probabilidade de manter conexão e proximidade aumenta imenso.

Muitos adolescentes rejeitam conselhos não porque não precisem deles, mas porque são oferecidos sem que tenham sido pedidos. E quando são pedidos, são muito mais valorizados.

Em algumas relações, pode parecer estranho fazer a pergunta diretamente — “Queres ser ouvido, ajudado ou abraçado?” Mas podemos adoptar esta ideia como regra pessoal: começar sempre por ouvir.

Depois de dar espaço para que o outro fale, podemos perceber qual o momento certo para perguntar ou agir com base naquilo que observamos. Assim, esta abordagem permite fazer uma transição natural: do ouvir para o ajudar, ou do ouvir para o abraçar — respeitando sempre o ritmo e a necessidade da outra pessoa.

 “Queres ser ouvido, ajudado ou abraçado?”

A grande mais-valia desta estratégia é a sua simplicidade e a sua eficácia em ajudar-nos a estar mais conscientes do que o outro precisa e não apenas do que temos para oferecer. Isso cria relações mais empáticas, mais respeitosas e com maior conexão, onde contribuimos melhor para a satisfação das necessidades do outro e, por isso, para melhores relações.

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