É possível conhecer, aplicar e até ensinar métodos de coaching com os outros e ter imensas dificuldades em fazê-lo nas nossas próprias vidas? Porque é que tantos coaches têm dificuldade em criar alinhamento nas várias áreas da sua vida?

“Uma coisa é promover, falar e ajudar os outros usando ferramentas de coaching; outra coisa é utilizar o coaching na primeira pessoa.”

Pedro Vieira

Para nos tornarmos um coach, um estudante ou utilizador de coaching, não precisamos obrigatoriamente de termos resultados incríveis nas várias áreas da nossa vida. As ferramentas de coaching são sobretudo ferramentas de questionamento que, quando utilizadas, criam movimento, progresso, mudança através de um movimento de se questionar, de mudar coisas, de experimentar, de se pôr em causa, de procurar soluções. Isso é diferente de quando reparamos que as coisas são sempre iguais, são muito superficiais, são pouco pensadas, que a pessoa não se está a pôr em causa, que acha que todos os seus resultados são um produto, não das suas ações e escolhas, mas exclusivamente daquilo que está fora, ou então, quando a pessoa acredita que todos os seus resultados dependem apenas e só de si, mantendo-se numa luta constante.

Por que é tão difícil fazer autocoaching?

Quando fazemos autocoaching, nós somos simultaneamente o coach (o agente que promove o processo de coaching) e o coachee (o cliente ou beneficiário do processo de coaching). E às vezes, é genuinamente difícil fazer um bom trabalho como coach quando não conseguimos nos ausentar da posição de coachee. Para fazermos um bom trabalho de autoquestionamento, é importante fazê-lo como se fôssemos duas pessoas, dissociando-nos momentaneamente e fazendo perguntas a nós mesmos sobre os nossos processos, os nossos resultados e a nossa vida. E isso pode ser muito difícil porque nós estamos a viver a nossa vida e a sentir emoções que se tornam filtros muito importantes.

Exemplo:

Se eu me sentir triste, desapontado/a ou frustrado/a e fizer autocoaching, continuo a sentir essas emoções fisicamente presentes no meu corpo, logo, elas podem condicionar muito a qualidade das perguntas que consigo fazer, as especulações que surgem a seguir, o tipo de respostas que eu consigo produzir.

É por isso que há situações em que a melhor forma de praticar autocoaching é esperar por um momento em que possamos sentir mais equilíbrio e facilidade em fazer o processo ou então pedir a ajuda de alguém capaz de nos orientar nessa investigação.

Outra dificuldade prende-se com o facto de que muitos de nós aprendemos coaching em formatos muito rápidos para depois começarmos a treinar e a afinar sabendo que nunca vamos chegar à pergunta perfeita, isto porque o processo de coaching foca-se muito em observar, em formular perguntas e propor exercícios com base no que observamos, em observar as respostas e em função disso partilhar modelos que ajudam o cliente a organizar a informação. É um trabalho que tem sempre uma subjetividade muito grande associada, pois depende do que está a acontecer e depende da qualidade da nossa observação e das decisões que vamos tomando durante o processo.

É por isso um trabalho de desenvolvimento sobretudo pessoal. Temos de ser nós, enquanto coach, a ter vontade de desenvolver as nossas habilidades de observar, de questionar, de intencionar, de nos pôr em causa, de aprender continuamente sobre o sistema humano e sobre as interações. O tempo que passamos formalmente com o instrutor de coaching acaba por ser muito pouco. O momento em que nos desenvolvemos como coach é através da nossa prática.

Além disso, não existe um guião que funcione para todos da mesma forma e em todos os contextos, pelo que o desenvolvimento das competências da observação, intencionalidade, presença e flexibilidade é que tende a gerar melhores resultados.   

Por fim, quando temos conversas de coaching e fazemos perguntas aos outros sobre a sua vida, também surgem em nós emoções na sequência das partilhas feitas pelo cliente: podemos sentir uma certa resistência, curiosidade, etc. Embora o processo seja sobre o outro, acontecem coisas connosco. É por isso que o coach tem de ser muito hábil a entender que, embora isto seja sobre o cliente, há um processo de autocoaching a acontecer pois o nosso inconsciente acha que é sempre tudo sobre nós e vai disparando reflexões sobre coisas que nos aconteceram, sobre crenças e perspetivas que temos, etc. Daí ser tão difícil para muitas pessoas trazer os processos de coaching para a sua vida, pois ainda não chegaram ao ponto de reflexão que lhes permita executar os processos sozinhos na sua própria vida.

De autocoaching a coaching

Enquanto coaches, nós também experienciamos dificuldades nas áreas chave da nossa vida (carreira, relacionamentos, parentalidade, dinheiro, forma física, etc). A diferença é que não ficamos totalmente à toa sem saber por onde começar porque fazemos autocoaching e através desse processo começamos a encontrar soluções. Daí ser incongruente quando vemos alguém que se apresenta no mercado como coach ou alguém que ensina coaching a ter dificuldades muito grandes nos seus relacionamentos, carreira, saúde, energia, etc. e essa incongruência nasce de não ter feito ou não estar disposto a fazer o trabalho de base para um coach: o autocoaching.

Para ser coach, é necessário que haja humildade em dizer quando não se sabe, quando é difícil, quando precisamos de pedir ajuda. No entanto, essa humildade não é muitas vezes bem recebida no mercado em detrimento de abordagens mais assertivas, com fórmulas rápidas e infalíveis que podem ser mais sedutoras.

Há aqui um mau serviço prestado àquilo que é coaching e ao que o coaching pode fazer por nós. Muitas pessoas fazem coisas que na verdade não é coaching, como por exemplo, dar bitaites, entregar fórmulas de como fazer. O coaching na sua base é muito simples: é a arte de manter conversas deliberadas onde queremos alcançar um determinado objetivo ou intenção e onde estamos mais interessados em explorar do que em fechar logo as possibilidades.

Muitos dos problemas que enfrentamos na nossa vida pessoal e coletiva resultam da falta destas práticas. No local de trabalho, na família, nos relacionamentos questionamos poucas coisas, somos pouco abertos a explorar, não definimos claramente as nossas intenções, não observamos atentamente e não exploramos diferentes oportunidades. Muitas vezes, achamos que os nossos problemas são sobre as outras pessoas e depois descobrimos que a base do coaching é o autocoaching, tal como a base da liderança é a auto-liderança ou a base da parentalidade é a auto-parentalidade.

Podemos concluir que o coaching não é definitivamente algo só para profissionais de coaching e para quem quer trabalhar como coach. Os processos de coaching também podem ser utilizados por quem quer integrar coaching nas suas funções enquanto empreendedor, líder de equipas, terapeuta, psicólogo, profissional de saúde, profissional de educação, profissional ligado ao desporto, às artes ou ao mundo das empresas. Outros podem querer aprender coaching pela prática de autocoaching.

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“Não é bem sobre o resultado, trata-se mais de mostrar que se está a seguir um processo que está orientado para o resultado, é um processo mais aberto.”

Pedro Vieira