Desenvolvimento Pessoal? Não gosto!

de Pedro Vieira

Algumas pessoas reagem com suspeição à ideia de Desenvolvimento Pessoal. Da minha experiência como agente de mudança, trabalhando há dez anos como coach, esta relação desconfiada assenta em algumas ideias fundamentais:

  • O Desenvolvimento Pessoal não é científico
  • O Desenvolvimento Pessoal é para pessoas místicas ou intuitivas
  • O Desenvolvimento Pessoal é superficial, assente em clichés e ideias feitas
  • O Desenvolvimento Pessoal não tem aderência à vida real e não produz resultados
  • O Desenvolvimento Pessoal é demasiado focado no indivíduo

Talvez, de acordo com a tua experiência, conheças outras objeções.

Deixa-me falar-te um pouco sobre isto. Não propriamente com o objetivo de convencer alguém, mais com a intenção de esclarecer alguns importantes mal-entendidos.

O Desenvolvimento Pessoal é um conceito, que convida a observar a nossa experiência atual e a explorar formas de a enriquecer. Como o nome indica, é um convite ao nosso desenvolvimento enquanto pessoas. Nesse prisma, é inicialmente mais focado na experiência pessoal, exportando depois essas aprendizagens para o nível sistémico ou macro.

Embora contenha várias abordagens, aquelas de que mais gosto (o Coaching, a Programação Neuro Linguística, a Hipnose, o Mindfulness) são altamente científicas (no sentido em que convidam o aluno a observar sem julgamento, formular as suas próprias hipóteses e a testá-las para verificar a sua funcionalidade). Nenhuma das abordagens, porém, reclama para si a cientificidade – prefere ao invés colocar a sua cientificidade à prova.

O Desenvolvimento Pessoal pode ser apresentado em muitos formatos diferentes: uns são mais superficiais e desenhados para gerar atenção e ação rápida, outros mais profundos e desenhados para gerar auto-conhecimento e bem-estar mental e emocional consistente. Todas as abordagens têm o seu papel e apelam mais a esta ou aquela pessoa, neste ou naquele momento.

O mais importante, acredito, é qual a verdadeira intenção de quem ensina/promove uma determinada abordagem do Desenvolvimento Pessoal? Em função dessa intenção, que se transforma num poderoso filtro, assim será o impacto criado sobre as audiências. Se a intenção for ganhar reconhecimento e dinheiro, os meios e impactos serão certamente diferentes daqueles produzidos com a intenção de gerar expansão na consciência humana. Isto não é mais, no fundo, do que a aplicação de conceitos sobre Desenvolvimento Pessoal ao próprio movimento do Desenvolvimento Pessoal.

Um dos maiores desafios acontece, na minha opinião, pelo facto do Desenvolvimento Pessoal ser promovido por pessoas que estão também nos seus próprios processos de Desenvolvimento Pessoal. Isto cria situações de aparente conflito de interesses. Como profissional desta área, ganho dinheiro com a promoção de programas online e ao vivo de Desenvolvimento Pessoal. Terei então um importante enviesamento a favor de dizer que as técnicas e processos que ensino geram altos resultados para os meus alunos e clientes? Conseguirei manter sentido critico em relação ao meu próprio trabalho? Terei tendência a colocar foco exclusivamente nos casos de sucesso? Terei abertura para escutar outras ideias e abordagens e questionar os meus próprios conhecimentos e resultados?

Invariavelmente, durante esta discussão, acabaremos a falar de Congruência, ou a capacidade de praticar aquilo que ensino. Observo níveis elevados de incongruência em muitas pessoas que promovem (e vendem) Desenvolvimento Pessoal. O que é bem mais fácil para mim do que observar a minha própria incongruência, claro. Cá estou, novamente, a aplicar conceitos de Desenvolvimento Pessoal ao próprio Desenvolvimento Pessoal!

Em que ficamos então?

Proponho as seguintes crenças pessoais e reservas:

  • O Desenvolvimento Pessoal é subjetivamente científico, pois propõe que os alunos/seguidores utilizem o Método Científico nas suas próprias vidas; ao mesmo tempo, considerando o grande interesse pela experiência subjetiva, o Desenvolvimento Pessoal não é científico. Um paradoxo que é, de facto, bastante científico e aplicável, acredito, à maior parte das ditas Ciências.
  • O Desenvolvimento Pessoal é para pessoas místicas ou intuitivas, sabendo que todas as pessoas são místicas e intuitivas – mesmo aquelas que ainda não o descobriram ou aceitaram; ao mesmo tempo é também para as pessoas lógicas e racionais, sabendo que todas as pessoas são lógicas e racionais – mesmo aquelas que ainda não o descobriram ou aceitaram.
  • O Desenvolvimento Pessoal é superficial, assente em clichés e ideias feitas; ao mesmo tempo é profundo, dinâmico e flexível, adaptando-se a diferentes propósitos e motivações. Até porque alguns clichés são muito profundos e algumas ideias muito profundas são perfeitos clichés.
  • O Desenvolvimento Pessoal tem aderência à vida real e produz resultados, pois a Vida é sempre real (ainda que perfeitamente ilusória e imaginária) e os resultados acontecem aqui e agora; mudo os meus pensamentos, mudo os meus sentimentos, mudo os meus comportamentos: existem resultados mais importantes do que esses?
  • O Desenvolvimento Pessoal é focado no indivíduo enquanto membro de grupos sociais e culturais, pois a experiência do individuo é indissociável da interação com os outros.

Que é como quem diz… Desenvolvimento Pessoal? Gosto!