A saúde mental é a base do bem-estar e afeta diretamente o nosso dia-a-dia. A ansiedade e a depressão são exemplos de doença mental que afetam as nossas relações e o mundo de trabalho, sendo muitas vezes abordada como um assunto trivial. No entanto, a banalização deste assunto não faz com que o mesmo desapareça. Ainda há muito tabu à volta de quem vive com uma depressão como também à volta de quem vive perto de alguém com uma depressão. Aproveitando o mês de Outubro em que se celebra o Dia Mundial da Saúde Mental, este é um tema que precisa ser cada vez mais abordado.

Preconceitos e banalização

Homens e mulheres lidam com desafios de foro mental. No entanto, preconceitos e banalização contribuem para que o cuidado com a saúde mental não seja feito de uma forma realmente saudável.

Se por um lado é difícil para muitas pessoas pedir ajuda e abordar este assunto com alguém (um familiar, uma pessoa amiga, um médico, um psicoterapeuta, um psiquiatra, etc), parece haver um estigma maior para um homem deprimido. Para as mulheres deprimidas, parece estar mais ou menos aceite que a mulher tome medicação e faça terapias. Contudo, para um homem, assumir que está deprimido ou que tem necessidade de recorrer a medicação para lidar com uma depressão, parece dizer que o homem não é capaz, não é suficientemente forte, não é um líder. E se for um homem que sabe muito de desenvolvimento pessoal, o autojulgamento que ele faz de si mesmo parece aumentar por não ser capaz de se retirar daquele buraco com todas as ferramentas que já dispõe, o que torna a escolha de dar o passo e pedir ajuda ainda mais difícil.

Por outro lado, quem lida com um desafio do foro mental, parece ter mais dificuldade em mostrá-lo aos outros por não ser algo visível como é o caso, por exemplo, quando temos uma perna partida. Quando alguém partilha que não está bem, é como se isso não fosse tão intenso como falar de um problema físico, havendo mais espaço para comentários do género: “Não estás bem, muda-te!”; “Anima-te”, o que, em si, pode ser um incentivo a ter comportamentos mais desesperados.

Na área do desenvolvimento pessoal, caímos muitas vezes na banalização dos estados emocionais depressivos – talvez por não entendermos esses estados que estamos a sentir – fazendo com que seja mais difícil sairmos desses lugares. Quando alguém está a lidar com uma depressão, clichés como “Se quiseres mesmo, tu consegues mudar” podem tornar-se perigosos pois, nessas situações, o que o outro recebe é um julgamento, o que o outro interpreta é que: “não gostas de mim como eu sou”; “Só me queres quando estou bem”; “Eu não tenho valor assim”; “Eu deveria mudar mas não consigo.”; “Sou insuficiente.” Isto é, os pensamentos que a pessoa já tem decorrente da sua depressão são reforçados através das tentativas de ajuda que recebe. 

Nesses momentos em que nos esquecemos de ter conversas que nos permitam começar a considerar o que é estar no lugar do outro, em que somos levados pela nossa vontade de animar o outro, descartamos aberturas de conversas que permitam criar espaço para a pessoa nos mostrar como se está a sentir.

Exemplo:

Estou com um amigo e ele começa a partilhar que está mesmo em baixo. Eu posso entrar muito rapidamente no papel do salvador.

Ninguém fica contente de saber que uma pessoa de quem gosta está em sofrimento e como não sabemos muito bem lidar com isso, começamos a dizer coisas como: “As coisas vão mudar”; “Agora vai ser melhor”; “Vais ver que vais ficar melhor.”

Por bem intencionada que seja a nossa tentativa de ajuda, é importante perceber que ela vem, por vezes, do facto de não querermos lidar com a nossa própria dor causada pela dor do outro, isto é, por não conseguirmos lidar com aquilo que sentimos por o outro estar a sofrer, daí a vontade de mudarmos o outro para nós próprios não sofrermos. Noutros casos, a própria depressão do outro pode começar a ressoar nos nossos próprios laivos de depressão que não estão a ser expostos ou tratados. Admitirmos isso pode ser importante para sabermos ajudar o outro, oferecendo-lhe um espaço para sentir o que está a sentir, conseguindo estar com a dor do outro.

A saúde mental é um processo

Há um processo para se chegar a uma depressão, assim como há um processo para se chegar a um bem-estar emocional e mental.  

O efeito desenvolvimento pessoal nem sempre promove uma boa saúde mental e pode até nos impedir de cuidar dela de uma forma realmente ecológica e sustentável. Se usarmos o exemplo do Mindfulness, por vezes as pessoas iniciam a prática porque querem obter algo dela: querem deixar de sentir ansiedade, querem deixar de se sentir deprimidas, querem focar-se mais, etc, isto é, têm expectativas em relação ao Mindfulness, estão à espera de um resultado específico. Essas expectativas podem boicotar o processo, principalmente quando os resultados não são tão rápidos como desejados ou não são os esperados, deixando-nos frustrados, irritados, tristes, inseguros, etc. No caso do Mindfulness, o convite feito pelo terapeuta Jon Kabat-Zinn é praticar Mindfulness pela prática em si.

Por outro lado, quando sentimos emoções desagradáveis ou que nos fazem sofrer, muitas vezes o nosso hábito de as colocar “por debaixo do tapete” pode conduzir-nos a um burnout ou depressão. O nosso analfabetismo emocional pode tornar o processo ainda mais avassalador. Pelo contrário, quando temos uma boa literacia emocional, quando não temos medo de sentir o que dói e nos faz sofrer, temos a oportunidade de aprender a ser mais resilientes. O reconhecimento do que nos causa dor é um bom ponto de partida, daí ser importante começarmos com as crianças e falarmos abertamente e honestamente sobre as nossas emoções, agradáveis e desagradáveis.

“Se nós mudássemos a forma como educamos as crianças, se nos focássemos em praticar uma parentalidade consciente, ponderada e empática, muito do que vemos hoje em relação à saúde mental seria muito diferente.”

Mia

Aprendermos a oferecer espaço à dor do outro, estando presentes sem julgamento, com curiosidade e compaixão, pode ser muito valioso. O espaço de empatia permite-nos mostrar ao outro que o vemos tal como é, que o seu valor enquanto pessoa é intrínseco, que o nosso amor é incondicional, que estamos presentes para ele mostrando-lhe quão importante ele é para nós, que o aceitamos plenamente.

Mais do que tudo, e não sendo este um artigo com respostas “certas”, precisamos falar mais sobre este assunto, quer estejamos deprimidos, quer estejamos a lidar com pessoas que estão deprimidas. Como devemos lidar com a depressão? Como podemos ajudar alguém que está com uma depressão?

Se sentes que precisas de ajuda ou conheces alguém que precisa de ajuda, e não há tempo ou vontade de marcar uma consulta com um profissional, há formas de falares com quem te pode ajudar, mantendo o teu anonimato.

Centro SOS – Voz Amiga (16h – 24h)

800 209 899

21 354 45 45

91 280 26 69

96 352 46 60

Conversa Amiga (15h – 22h)

808 237 327 (Número gratuito)

210 027 159

SOS Estudante (20h – 1h)

239 484 020

Telefone da Esperança (20h – 23h)

222 080 707

Telefone da Amizade (16h – 23h)

22 832 35 35